Ontem a noite eu e um amigo trocávamos uma idéia sobre qual seria a melhor maneira de se fazer negócios com TI no Brasil. Rapidamente entramos em um debate sobre como aproveitar as oportunidades que esse ramo oferece. Esse meu camarada é um dinossauro da TI no país. Trabalha com isso a mais de 40 anos, sempre na crista da onda. Ele me contava sobre como os profissionais “daquela época”, trabalhando basicamente com sistemas monolíticos proprietários vislumbravam para o futuro um ecosistema mais flexível. Me explicava que neste novo paradigma o arquiteto de sistemas teria a sua disposição pequenos módulos para serem armados conforme a necessidade baixando custos e outras complicações alheias ao foco do negócio.
Nos últimos 10 ou 15 anos, como qualquer sênior de TI no mundo, esse meu amigo esteve muito mais na parte de gestão do que na parte técnica. Esteve trabalhando muito mais com as soluções da Microsoft, da IBM e da Oracle do que com qualquer outra coisa. É lógico que ele sabe apenas sobre o que sai na Information Week. Ele citou o aplicativo Waze e seu modelo de negócios. Argumentou que o importante era a idéia e não reinventar a roda e nisso concordamos — em parte. Defendeu que a “sacada do cara” havia sido pegar as tecnologias que já existiam e apenas juntar com o quente do momento, mídias sociais. Concluiu afirmando que estes fatores foram a razão do sucesso do aplicativo bastando “jogar uma capa de interatividade” por cima do que já existia de tecnologia.
Vamos por partes. Você deve se lembrar do fenômeno que foi e ainda é a conta “Lei Seca” no Twitter. Hoje de manhã colocando aquele debate no papel me veio uma resposta clara para a inquietude que eu sentia enquanto escutava este amigo expor seus argumentos. Okay, não vamos reinventar a roda. De fato não estou a favor de reescrever os protocolos de telecomunicação e posicionamento via satélite, não é viável ainda que seja desejável. Tão pouco concordo que é trabalho menor criar um produto focado na experiência do usuário como no caso do Waze, pelo contrário. Na minha opinião a grande sacada dos caras e o segredo do sucesso deles nem passa pela TI.
A grande sacada dos caras foi perceber que havia um negócio sobre esse padrão de uso no Twitter. Ou seja, pensaram nas pessoas. Sim, também pensaram no hype das mídias sociais. Sim, utilizaram infra-estrutura de TI já existente. Sim, não inventaram a roda. Tudo isso os caras fizeram, concordo. Porém, para eles o fator crítico de sucesso foi perceber que havia essa dor, que havia essa necessidade e que esta oportunidade poderia ser ampliada para além do que os próprios usuários já estavam fazendo no Twitter.
Infelizmente no Brasil as coisas não são tão óbvias. Nosso país foi o último a abolir a escravidão nesse lado do mapa. Nossas instituições políticas, econômicas e sociais interagem numa lógica que tende à desvalorização daquilo que é humano em favor do que pode ser considerado alegórico ou supérfluo. Nossas empresas privadas e o estado jogam um duro jogo onde é o cidadão comum quem sempre perde seguido do pequeno e médio empresário local que vez ou outra sai ganhando. No Brasil as vitórias não são alcançadas, são permitidas. E o caminho para que isso mude talvez está em permitir um pouco mais. Permitir que os indivíduos possam ousar, errar, transgredir e transcender.
Quase sempre fico desanimado quando analiso um conjunto de empresas brasileiras com negócios baseados em TIC. Basicamente não há inovação. Não há ousadia. Não há liberdade ou criatividade, finalmente, não há retorno. Acredito que este meu amigo pensará o contrário ao ler estas linhas. Peço licença pois tenho direito de registrar em palavras meus pensamentos. Estou certo de que ele contestaria afirmando que tem muita gente feliz e ganhando muito dinheiro apesar do que eu digo. E eu respondo: poderiam estar ganhando mais. Aqui faço outra pausa para marcar uma distinção. Quero dizer que os que permitem muitas vezes são também os permitidos e por isso repito que a única maneira de romper este ciclo é permitindo mais. Permitindo-se.
É de gente que estamos falando. Seja qual for o produto, seja qual for a empresa se o foco não forem as pessoas e como tornar a vida delas melhor, desculpe-me, mas não haverá sucesso no largo prazo. Eu acredito que grandes empresas, empresários e executivos deveriam investir nas pessoas tanto ou mais do que investem em matéria prima ou meios de produção. Pessoas são fontes inesgotáveis de recursos. O sonho dos profissionais de TI daquela geração que ajudou a começar com isso no Brasil, hoje em dia já é uma realidade. Uma realidade talvez muito melhor do que eles sequer imaginaram. Nas últimas décadas os custos para colocar em marcha um projeto de TI baixaram em proporção direta à velocidade com que estas tecnologias evoluíram e isso é simplesmente mágico.
Por isso é que eu faço um apelo aos CEOs, CFOs e CIOs das grandes empresas brasileiras: por favor parem de subcontratar e voltem a desenvolver. Invistam nessa juventude que entra e sai das nossas universidades cheia de idéias maravilhosas mas sem oportunidade nenhuma para ousar. Mas não só aos grandes dirijo a palavra. Aos pequenos eu gostaria de pedir que deixem de entrar em operações suicidas e foquem no seu objetivo mais importante. Aquele que é o principal da sua vida. Faça dos seus valores os valores da sua empresa e não pense apenas na grana. Sobretudo parem de fazer cópias e parem de pensar pequeno.
Começar pequeno dentro de um escopo bem determinado não significa permanecer assim pra sempre. Parem de pedir permissão e passem a permitir mais. Desafiem as regras e comecem desafiando-se a si mesmo e aqueles que estão mais próximos. Parem de acreditar que as coisas são pra ontem e comecem a se concentrar no agora. Expandam seus limites e passem a ditar suas próprias regras tomando o cuidado de não passar por cima das outras pessoas. Fazer negócios no Brasil é um desafio, tal qual viver neste país. Sendo assim, vamos à luta.